Esse livro chamou a minha atenção num camelô há três anos. Decidi comprar na hora, mas só há alguns meses parei para ler, e valeu muito a pena.
Proust and the Squid se propõe a investigar como o processo de leitura funciona, ou seja, como o cérebro decifra letras, fonemas, palavras e frases para extrair sentido de um texto. Como o próprio título já entrega, essa explicação parte tanto da história da leitura ao longo dos milênios como da neurociência.
De início, Wolf conta uma breve história dos sistemas de escrita, mostrando as diferenças entre, por um lado, aqueles baseados em hieroglifos, ideogramas e outros símbolos que serviam para representar objetos e ideias, e, por outro lado, aqueles baseados em símbolos que serviam para representar fonemas (isto é, alfabetos). Essa transição, ela argumenta, não teve pouco impacto: o primeiro tipo de sistema de escrita demandava que os leitores acessassem, na memória, o significado de cada símbolo durante a leitura, enquanto o segundo sistema exigia apenas que os leitores acessassem o significado de poucas dezenas de fonemas. Essa redução do trabalho mental necessário para ler permite que o cérebro possa dedicar seus recursos a outras atividades durante a leitura. Nas palavras da autora,
De início, Wolf conta uma breve história dos sistemas de escrita, mostrando as diferenças entre, por um lado, aqueles baseados em hieroglifos, ideogramas e outros símbolos que serviam para representar objetos e ideias, e, por outro lado, aqueles baseados em símbolos que serviam para representar fonemas (isto é, alfabetos). Essa transição, ela argumenta, não teve pouco impacto: o primeiro tipo de sistema de escrita demandava que os leitores acessassem, na memória, o significado de cada símbolo durante a leitura, enquanto o segundo sistema exigia apenas que os leitores acessassem o significado de poucas dezenas de fonemas. Essa redução do trabalho mental necessário para ler permite que o cérebro possa dedicar seus recursos a outras atividades durante a leitura. Nas palavras da autora,
“The reduced number of symbols reduces the time and attention needed for rapid recognition; and thus fewer perceptual and memory resources are needed.”
Ainda na parte sobre a evolução histórica da escrita, o livro dedica algumas páginas a expor (e, em alguns casos, rebater) as objeções de Sócrates ao uso da escrita. Isso foi particularmente interessante para mim por dois motivos. Em primeiro lugar, eu já tinha ouvido falar dessas objeções de Sócrates, mas nunca tive uma plena noção do conteúdo delas (isto é, dos motivos pelos quais ele era contra a escrita) e nunca vi alguém efetivamente discutir e levar a sério essas objeções. Wolf faz isso bem, ainda que brevemente. Em segundo lugar, eu não esperava que um livro tão dedicado a exaltar a escrita fosse aceitar o desafio de abordar essas objeções: o livro poderia ter simplesmente evitado esse tópico e ainda seria ótimo. Decidir encarar esse tema de frente mostrou, para mim, tanto confiança na própria posição como abertura para questiona-la.
O livro segue com uma parte sobre o processo neurológico de aprender a ler. Nesse ponto, Wolf também parte de uma ordem cronológica: começa nos primeiros estágios de aprendizado da leitura e chega ao leitor fluente, explicando o que exatamente é aprendido e quais erros e dificuldades são peculiares a cada etapa.
A última parte do livro é sobre dislexia: o que exatamente causa esse fenômeno, o que pode ser feito para que pessoas com dislexia possam aproveitar ao máximo as vantagens da leitura, e, finalmente, o que a dislexia pode nos ensinar sobre leitura de modo geral.
De modo geral, gostei bastante desse livro e recomendo muito. Uma crítica possível é que ele tem um posicionamento muito romântico a respeito da leitura, tanto que algumas exaltações chegam a ser cafonas. Quem não considera a leitura especial por si só vai certamente ficar incomodado com esses trechos. Mesmo assim, vale a pena dar uma chance. Não tem nada de prolixo, os argumentos são bem defendidos, a autora usa um vocabulário muito rico e figuras claras para ilustrar suas explicações (principalmente nas partes sobre neurociência). Se você estiver em dúvida do que ler nesse final de ano, esse livro pode ser uma boa ideia.