Não tenho muita dificuldade em fazer academia; apesar de meio entediante, consigo puxar ferro repetitivamente sem problemas, sem muita dor, em todas as máquinas - exceto no extensor de pernas. Sempre que eu tento fazer esse exercício, surge uma pontada de dor bem forte logo acima do joelho, e eu tenho certeza que tem algo errado, e chamo um instrutor para me ajudar. E geralmente se segue uma variação da conversa a seguir:
_Tô sentindo uma dor bem forte acima do joelho, isso é normal?
_Uh... Bem, não é comum, mas...
_...
_...
_Eu devia parar?
_Bem, dor faz parte.
_Mas tá doendo muito mais do que o normal, eu não sinto isso nos outros aparelhos.
_Bom, uh, se você quiser parar você pára. Vai pra outro aparelho.
Esses diálogos sempre foram bem decepcionantes para mim. Não só não me ajudavam a entender o que era aquela dor acima do joelho, como também mostravam que os instrutores de academia - que foram treinados para isso - também não fazem a menor ideia e não têm uma resposta minimamente boa para dar.
Dor normalmente tem alguma utilidade, mas às vezes é só um erro da natureza e não serve para absolutamente nada. E eu antigamente presumia que médicos sabiam diagnosticar de onde vinha e para que servia cada dor, mas essas experiências na academia me deixaram bem cética. E se não existirem adultos de verdade? E se ninguém conseguir diagnosticar com precisão qual dor é útil e qual não é? E se eu precisasse usar o extensor de pernas? E se eu quisesse muito? Como eu ia saber exatamente se aquela dor é um sinal para eu parar ou se é algo que eu devo ignorar?
Acho que isso se aplica a todo tipo de sofrimento. Não existe nenhum observador neutro das nossas vidas que vá dizer "essa dor faz parte, mas aquela é só sofrimento desnecessário que vai te fazer mal". Então você tem que tentar descobrir na tentativa e erro. Só que a tentativa e erro, com esse tipo de coisa, tem consequências péssimas: você corre dois riscos grandes. O primeiro é o de desconsiderar dores importantes e acabar se estrepando desnecessariamente (por exemplo, eu poderia continuar fazendo extensão de pernas e romper um ligamento). O segundo é o de achar que toda dor é um sinal para parar, e acabar se privando de fazer qualquer coisa.
Esse é um daqueles problemas gerais da vida que eu acho que não tem solução. Talvez todo mundo só acabe com suas vidas sub-óptimas mesmo, porque é impossível saber até onde a gente deve tentar aguentar. Muito pouca dor, e você pode acabar com muito pouca recompensa. Dor em excesso, e você pode se quebrar no meio. Não tem ninguém pra te ajudar a saber o que é dor útil e o que é dor inútil, mas acho que isso é só parte da vida mesmo.