Outro dia eu parei pra rever a primeira temporada de Bojack Horseman. Episódio vai, episódio vem, e eu começo a notar um padrão absurdo: frases ditas en passant que revelam com clareza absurda o futuro dos personagens. Temos a frase que a Sarah Lynn diz quando é uma criancinha, no camarim; a primeira frase que o Bojack diz para o Herb; a primeira cena em que a Princess Carolyn aparece; a primeira vez que o nome da Diane é mencionado. O roteiro é ridiculamente consistente sobre as expectativas e motivações dos personagens. As temporadas 2, 3 e 4 não são remendos ou histórias criadas aleatoriamente a partir do que eles acham que agradaria o público; são arcos que sempre estiveram ali, guardados, prontos para serem desenvolvidos. Os roteiristas criaram uma tonelada de bom material e não usaram tudo de uma vez: deixaram a história transcorrer naturalmente, para os arcos surgirem quando fosse oportuno.
Eu juro que não comecei a escrever esse texto só para elogiar o roteiro, tenho um ponto ainda. Bear with me.
Bojack é uma série muito pesada, isso é consenso. Não só enfrenta temas pesados, como geralmente não consegue um final otimista. Vários episódios acabam com os personagens tristes, frustrados, com conflitos mal resolvidos, desconfiados uns dos outros, desiludidos. Às vezes, algum conflito muito longo acaba sem resolução nenhuma, e você se pergunta até se valeu a pena ver. Afinal, pra que isso? Pra que se torturar vendo uma história que não vai acabar de nenhum jeito decente, que vai te lembrar de todas as suas histórias mal resolvidas e que não vai te trazer nada além de mágoa, ressentimento e raiva?
Bom... Porque Bojack não é só isso.
Como eu expliquei no começo, os arcos narrativos são muito bem planejados e amarradinhos. Os roteiristas não estão largando os personagens a esmo. Eles têm algum plano para eles (além de fazê-los sofrer). Sim, quando você olha no micro, pode parecer que não tem plano nenhum, que é tudo caótico e que o destino dos personagens é voltar sempre ao status quo, às suas vidas tristes. Mas a verdade é que a história está se desenvolvendo e os personagens estão indo para algum lugar: a gente só não consegue discernir muito bem para onde é.
Minha teoria é que o grande lema de Bojack (ou um dos grandes lemas, pelo menos) é que as lições demoram para serem aprendidas. Tem muita coisa que cada personagem poderia fazer, desde o começo, para chegar mais perto de onde quer. Mas é difícil saber exatamente o que se quer, é difícil começar a ir na direção certa, é difícil vencer a paralisia. E mesmo quando alguma coisa trágica acontece, mesmo quando parece que o universo está berrando na cara de um personagem que ele deveria fazer alguma coisa, mesmo quando ele já cometeu um erro três vezes e está prestes a cometer a quarta... Ele faz a coisa errada de novo. Por n motivos. Por medo, insegurança. Porque ele não é completamente racional. Porque ele acha que não merece ser feliz. Porque ele tem medo de falhar.
Então os personagens vão lá, erram, fazem escolhas estúpidas, sentem pena e raiva de si mesmos, erram e erram de novo. Em algum ponto eles vão aprender; mas isso não necessariamente conserta as coisas. Eles podem aprender depois que alguma coisa irreversível já tenha acontecido. Podem machucar a si mesmos e aos outros no processo. Podem perder muitas oportunidades.
Para mim, essa é a grande tragédia de Bojack: saber que você pode aprender com seus erros, mas nem sempre isso vai ser suficiente. E mesmo assim continuamos aprendendo, continuamos aprendendo enquanto estamos vivos.